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João Pega
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Diária

"Haja memória"


Categorias: Opinião terça, 16 abril 2024

O Chega foi o grande vencedor dos círculos da emigração, tendo somado mais dois deputados aos 48 já eleitos. O que é uma vitória expressiva, tendo em conta que os votos dos portugueses que vivem no estrangeiro elegem 4 deputados, sendo que 2 são do Chega. Votaram globalmente em força num partido que é contra a emigração que os acolheu a eles próprios. É estranho não se lembrarem que somos um País onde as pessoas fugiam “a salto” para França. Viviam miseravelmente em “bidons villes", onde sofriam todas as formas de humilhação e de exclusão social, sendo que alguns o sentiram na própria pele. O que parece que essas pessoas, entretanto, se esqueceram da sua história, a que se juntam os seus descendentes e os que continuam a sair pelos mesmos motivos - melhorar a sua qualidade de vida - ou para conseguirem ter uma carreira com maior dignidade.

Metade dos eleitos pelo circulo de emigração votaram num partido que assume posições contrárias à imigração e demonstraram pouca solidariedade com os pares, os quais, como eles próprios nos países que escolheram para trabalhar e viver, vieram para Portugal pelos mesmos motivos que os nossos foram para França, Suíça, Alemanha, Canadá, EUA, etc., etc. …  Ao fim e ao cabo não basta passar as provações para termos consciência do outro. Esperamos que seja um voto de protesto contra um sistema político-económico que, verdadeiramente, não tem servido os interesses do povo, de forma que a pessoa sinta necessidade de fazer alguma coisa, ainda que possa não ser feita da forma mais informada. Caso contrário, seria incompreensível votar num partido que a estar no poder nos países citados jamais os portugueses teriam tido a possibilidade de sair de Portugal, ou seja, de melhorar a sua qualidade de vida.

Estes resultados eleitorais têm que ser encarados com espírito democrático e tendo em conta que está em causa um voto de protesto ao denominado sistema que não tem respondido ao que o povo almeja. E o fenómeno votar em partidos que defendem tais valores/princípios não é exclusivamente português, trespassa a Europa. Quem diria que tantos países, em todo o mundo, entrariam em tamanho retrocesso civilizacional e humano? Surge-me citar um trecho de uma letra da Garota Não feita de títulos de canções de Sérgio Godinho: “Cuidado com as imitações/ e as Bíblias desse deus ateu /Há bilhetes de ida e volta/ Salazar nunca morreu”. 

Marília Alves