Tomás Almeida: o designer que se inspira no Carnaval e já chegou à Moda Lisboa

Com peças de roupa irreverentes, cada uma com detalhes e pormenores pensados minuciosamente, a marca Sancho, criada por Tomás Almeida, com apenas 23 anos, de Cantanhede, já vestiu Liliana Filipa para a Moda Lisboa, Soraia Ramos num concerto no Coliseu dos Recreios e Bárbara Bandeira.
As criações da Sancho têm várias influências, uma das quais o carnaval. Tomás Almeida já pertence à Escola de Samba Amigos da Tijuca há cerca de 6 anos, foi recentemente, considerado o melhor carnavalesco do país.
Tens uma marca criada, a Sancho, há quanto tempo?
A Sancho começou em dezembro de 2023, e fiz a minha primeira coleção nessa altura.
Qual o motivo do nome?
É uma homenagem à minha avó, que já não se encontra entre nós, é nome de família. Esta marca está assente na tradição local. A premissa da Sancho é partir do local para o global.
Qual a tua inspiração?
A tradição local, como já referi. A Sancho tem o conceito de roupa de street oversize, algo confortável, mas com grandes proporções, aliada a uma vertente de alta costura com penas, cristais, aplicações e bordados. Tento sempre ter o conceito português nas peças como jacquard, colchas antigas e tecidos mais antigos que me diferenciam.
Neste momento que projeto está a desenvolver?
Acabei recentemente de desenvolver a minha coleção para o próximo verão. É uma coleção cápsula. São peças em linho para pessoas comuns usarem. Também já desenvolvi outras peças representativas da Sancho. Para além disso, assim que termino as minhas peças, produzimos vídeos e fotografias para comercializar a roupa.
Quantos elementos tem a tua equipa?
Neste momento trabalho sozinho, mas tenho amigas (a Joana, a Lena e a Marisa) que me ajudam imenso.
Como é que começou o gosto pela moda?
Há cerca de dois anos. Licenciei-me em Coimbra, em Agricultura Biológica, ou seja, estudei na área de ciências. O mundo da moda não me dizia nada, a minha mãe é que me vestia para ir para a escola quando eu era criança (risos). Acredito que este gosto surgiu devido ao carnaval. Portanto, sempre tive gosto pela costura, mas não tinha qualquer ligação à moda, quando entrei para a Tijuca comecei a costurar. Aliás, dois anos depois de entrar nesta Escola tornei-me carnavalesco, já era eu que desenhava os fatos. Para além disto, na pandemia, quando ficamos todos fechados em casa, comecei a ver a moda com outros olhos. Achei que a moda em Portugal estava muito clássica e comercial. Na minha opinião, faltava arte na moda. Aliás, gosto de aplicar nas minhas confeções algumas das nossas tradições portuguesas de forma a criar peças artísticas.
É então durante a pandemia que surge a primeira criação?
Sim. Durante a pandemia descobri umas colchas muito antigas em casa da minha avó e pensei: posso usar estas colchas para criar umas peças, talvez fique engraçado! Então fiz e partilhei no Instagram. É nesta altura que percebo que a moda seria a área em que eu iria apostar.
A tua família apoiou-te nesta decisão?
Sim. Tenho muita sorte nesse aspeto. A minha família é incrível. Ajudam-me sempre tanto na produção, como no desfile que fiz em dezembro. A minha mãe é designer e o meu pai é arquiteto e professor de artes, portanto eu já estava destinado às artes.
Fizeste algum curso de especialização em moda?
Sim, estive em Lisboa e tirei um curso de design moda, após a pandemia.
Que desafios encontraste e encontras nesta carreira?
Após o curso que tirei em Lisboa comecei a perceber que nesta área, principalmente em Portugal, era muito difícil evoluir. Senti receio de não encontrar o meu espaço na moda em Portugal e considero que os custos de equipamento para confeções são altos. O primeiro desafio foi colocado pelo município de Cantanhede, em 2023, quando eu fui convidado para organizar o evento de moda, na cidade, com desfiles e propuseram que eu fosse uma das marcas presentes no evento. Nunca tinha feito um desfile, não sabia como era o processo de organização, valeram-me os contactos que tinha feito durante o curso de design em Lisboa. Foi um grande desafio, mas num mês e meio criei uma coleção para o desfile.
Desenhas e confecionas todas as tuas peças?
Sim. Sei que existe muito a ideia de que um designer de moda desenha e depois manda para produção, mas no meu caso, como comecei sozinho, sinto que preciso de ser eu a fazer a peça tal e qual como eu quero. Sei que mais tarde vou ter que delegar, porém agora desenho, confeciono e faço a modelagem sozinho. Não posso deixar de salientar que peças com uma carga de trabalho maior peço ajuda a amigos e familiares.
Consegues contar ou explicar um momento de criatividade?
Eu vou buscar inspiração fora da moda para depois introduzir na área. A minha inspiração vem de coisas momentâneas, algo que eu vejo, por exemplo a nível de arquitetura ou até numa exposição um determinado objeto que me dá ideias para peças de roupa. Logo no momento escrevo no telemóvel aquela que é a minha inspiração, assim que chego a casa faço desenhos baseados naquilo que escrevi e que é a minha ideia inicial. Tenho muitos desenhos guardados e quando quero desenvolver uma coleção acabo por compilar e tentar desenvolve-los.
O carnaval influencia nas tuas criações?
Sim, esta vertente de bordados e aplicações são influência do carnaval.
O que fazes para te manteres atualizado sobre as tendências da moda?
A moda é como uma arte. Existem as tendências, que eu acho que torna a moda um pouco previsível, então tento fugir ao que é expectável e faço peças completamente diferentes. Sou muito influenciado pelo que se faz em outros países, uma das marcas que me apaixona é a Schiaparelli que é muito artística.
Já participaste na Moda Lisboa?
A desfilar não, mas poderá via a acontecer futuramente. Estive na última edição presente com peças minhas e o feedback foi incrível.
Já vestiste Bárbara Bandeira, Soraia Ramos e Liliana Filipa…
E vão surgir mais nomes brevemente (risos). A Liliana Filipa participou na Moda Lisboa com o meu casaco de cristais, a peça que me catapultou. A partir daí comecei a ser mais conhecido e ser a ser contactado para mais trabalhos.
Como te sentiste com tudo isto?
Quem me conhece diz que eu sou “uma pedra de sentimentos”, não sou muito de exteriorizar o que estou a sentir. Não me estou a deslumbrar muito, tenho sempre os pés bem assentes na terra. Confesso que o dia em que fiquei fora de mim aconteceu quando a Soraia Ramos deu um concerto no Coliseu dos Recreios e vestiu uma peça totalmente feita na Sancho.
Tens peças à venda?
Ainda não. Até agora só faço peças por encomenda para venda.
Tens aspirações internacionais?
Claramente. As minhas peças enquadram-se muito no estilo asiático. Segundo um estudo, na Ásia os homens investem muito mais em roupa em moda do que as mulheres. É este mercado que eu pretendo. Os homens também podem e devem vestir peças irreverentes e introduzo esse conceito na Sancho. E tenho o sonho de desfilar em Milão ou em Paris.
Fazes parte da escola de samba Amigos da Tijuca, da Mealhada, há quanto tempo?
Seis anos.
Como entraste para esta escola?
A escola era sediada em Cantanhede. Só há cerca de um ano é que passou para a Mealhada. Entrei através de uma amiga que já pertencia à Escola de Samba e tinha o objetivo de desfilar na comissão de frente porque adoro dança. E de um momento para o outro passo a ser carnavalesco.
Foste considerado o melhor Carnavalesco do país, o que representa isso para ti?
Não estava à espera, eu estava nomeado com carnavalescos que já fazem isto há muitos anos. Fiquei sem palavras com esta nomeação.