“Acho que este álbum foi qualquer coisa de divino” – Francisco Saldanha
Tem 39 anos, é músico profissional e apresenta agora o seu primeiro álbum a solo, depois de uma longa carreira, recheada de inúmeros projetos. No último Verão, Francisco Saldanha “abraçou” a natureza e pôs “mãos à obra” para compor um disco de música ambiental e terapêutica, com sonoridades pouco convencionais. “Espiral Phi” é o título do CD, já disponível desde o início de março, que marca a estreia do músico, natural de Antes, nas edições discográficas. O Jornal da Mealhada foi conhecer melhor esta obra e descobriu o que levou Francisco Saldanha a “aventurar-se” num estilo musical mais “exótico”.
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Qual a sensação de ter o disco nas mãos, depois de tanto tempo e trabalho investidos?
Receber uma coisa destas é uma sensação fantástica, única. Uma coisa é imaginar, outra coisa é ter isto fisicamente nas mãos. Não sei, acho que é quase como ter um filho (risos). É mesmo o meu primeiro álbum, nunca tinha pensado em fazer nenhum CD antes.
Como surgiu a ideia para concretizar esta obra musical?
Isto tudo começou porque eu queria construir uma flauta, depois de ter visto um grupo peruano a tocar num festival de “folk music” em Ancas. Lá consegui fazer a flauta com as minhas mãos e depois quis gravar o som da flauta com uns arranjos que fiz no teclado. Publiquei o vídeo no Facebook e acabou por suscitar algum interesse e até admiração, porque as pessoas não estavam à espera. E eu nem sabia que conseguia fazer este tipo de música. A partir daí, surgiu um convite da clínica Multi Therapies, da Mealhada, para vender o meu trabalho. Gostaram muito da minha música e queriam um produto da Bairrada. Mas eu só tinha uma música e eles queriam um álbum completo. Eu pensei “bem, é um desafio, se eu fiz esta música, se calhar consigo fazer um álbum”.
Quanto tempo demorou o processo de composição e produção?
Foi durante o Verão do ano passado, numa altura em que não tinha o “stress” de dar aulas, só ia tocar ao fim de semana. Eu quando começo a fazer uma coisa, não posso ser interrompido, senão desligo da ideia. Então, em cada dia que vinha para o meu estúdio, só descansava quando tivesse uma faixa completa. Depois, começaram a surgir ideias sobre o conceito do álbum, a divisão entre “divergente” e “convergente”, até mesmo a ideia para a capa, que é uma fotografia que me foi proposta pelo Adérito Duarte, da Multi Therapies, que fez questão que a Mata do Bussaco aparecesse em primeiro plano.
Como descreve o conceito deste álbum e de que maneira foi construído?
Este Verão, entrei um bocado no mundo da espiritualidade e acho que este álbum foi qualquer coisa de divino. Se voltasse a fazer, se calhar não fazia igual. Há coisas que não sei como fiz, não escrevi nada, não registei nada. Foi tudo improvisado, feito na hora, sem grande edição, foi completamente espontâneo. Este álbum reflete muito a serenidade, a natureza pura. Retrata a primeira das quatro eras, designada pelos hindus por “Era do Ouro”, em que havia uma sincronização total entre o ser humano e o planeta, onde a maldade e a mentira não existiam. Então, este CD serve para que possamos refletir naquilo que temos de bom e que estamos a destruir. Em específico, aqui na Bairrada, foquei-me em locais como o Bussaco, o Luso, a Antes e a Praia de Mira. E estão presentes sonoridades desses sítios para que as pessoas se sintam na natureza e regressem às origens.
Qual o significado do título do álbum “Espiral Phi”?
O termo “phi” vem da sequência matemática de Fibonacci, que está presente na natureza. Comecei a perceber que tudo o que existe é em forma de espiral e cumpre esta sequência, que é 1,618. Isto é representado numa das faixas do álbum, que se chama “1.618 A.C.”, em que A.C. significa “Em Antes, a Criação” em vez de “Antes de Cristo”. É também um desafio para quem ouve o CD tentar perceber o que significam alguns termos e começar a entrar neste mundo. Eu próprio fiz a obra e depois fiz a análise e bateu tudo certo. É a tal espiral, nada é ao acaso, nós é que não tomamos atenção ao que está à nossa volta. Por isso é que acho que este trabalho foi uma obra divinal.
Neste “Espiral Phi”, houve também participações de outras pessoas, além dos sons e instrumentos gravados por si?
Sim, contei com algumas participações. Por exemplo, logo na primeira faixa, “Big Bang”, participou o João Silva, que tocou gaita de foles. Na “Pérola Azul”, participou a Nawal Mahfoud, marroquina que cantou alguns versos em árabe, e o Fernando Mariano, que tocou baixo. Tenho também a participação do meu sobrinho Francisco, quando tinha 18 meses, a fazer alguns vocalizes e a rir-se na música “Satya Yuga”. E ainda o Raúl Cabrita, com alguns efeitos de guitarra elétrica na faixa “Partículas Fractais”.
Teve algum tipo de apoio financeiro por parte de entidades locais para a edição deste disco?
Tive o apoio da Caixa de Crédito Agrícola da Mealhada e também da Câmara Municipal da Mealhada, de mil euros cada. Foram uma grande ajuda para dar continuidade a este projeto, só na produção do álbum foram gastos perto de dois mil euros, agora terei de investir mais dois mil em marketing e na produção dos espetáculos. Estou muito grato a estas entidades, que representam também muito a Bairrada.
De que forma é que as pessoas podem adquirir este álbum, além de, obviamente, poderem entrar em contacto com o próprio autor?
Quem quiser conhecer um pouco mais da história e do significado deste trabalho, ou quem quiser um autógrafo, pode fazê-lo diretamente comigo. Depois, o CD vai estar à venda na FNAC em Coimbra, mas julgo que poderá ser encomendado em qualquer FNAC do país. Vai estar à venda na Loja da Mata do Bussaco, na clínica Multi Therapies na Mealhada, no Conservatório Artes e Comunicação em Oliveira do Bairro, no Club de Ancas e no Centro de Estudos Musicais de Cantanhede. Ainda não está confirmado, mas poderei vir a ter o CD à venda no posto de turismo em Mira. Uma das ideias seria ter o CD à venda na Mealhada, mas se calhar mais para pessoas de fora, para turistas. Para quem vive cá, podem falar comigo e eu entrego em mãos. Eu quero estar a acompanhar o processo de distribuição porque não quero que isto perca o controlo. É o meu “filho”, vai andar por aí, mas quero andar a protegê-lo. Eu fiz este trabalho de maneira tão dedicada e pormenorizada que não queria entregar isto em mãos alheias.
Existem já concertos marcados para apresentar este trabalho ao público?
Sim, tenho agendados dois concertos para já. Em maio, vou atuar no evento “Stay Zen” na aldeia do Talasnal, concelho da Lousã. No dia 15 de julho, vou atuar numa sessão de yoga no festival “Folk Ancas”, em Anadia. Vai ter vários terapeutas a fazer yoga e massagens e eu vou estar a tocar. Em princípio, irei atuar também no Cineteatro Messias, mas ainda não tem data marcada. Falei com alguns músicos para começarem a ver as músicas porque quero tentar reproduzir aquilo que está no CD ao vivo. A ideia do concerto é ser uma coisa muito intimista, à média luz, já tenho tudo planeado na minha cabeça. Tentar que haja um cenário em que as pessoas estejam tranquilizadas, com imagens projetadas, sincronizadas com a música.
O reconhecimento que tem tido nos últimos tempos é uma oportunidade para surgirem novos projetos?
Sim, é curioso porque, atrás disto, já me lançaram um desafio para compor para o Festival da Canção do próximo ano, enviaram-me poemas para eu “musicar”, convidaram-me para ir tocar a solo aos Estados Unidos e vou fazer uma parceria com os Palhaços d’Opital para arrancar com um projeto de apoio a lares de idosos até ao próximo Verão. Nos últimos dois anos, o facto de me expor mais e mostrar aquilo que faço tem-me aberto muitas portas, já devia ter feito isto há mais tempo.
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Perfil
Francisco Saldanha começou a aprender órgão aos onze anos. Aos dezoito, ingressou no Conservatório de Coimbra, onde frequentou o curso de piano clássico. Paralelamente, foi aprendendo jazz e fez parte de vários projetos musicais, nomeadamente bandas de baile durante dez anos. Atualmente, dá aulas de piano, bateria, guitarra e canto no Centro de Estudos Musicais de Cantanhede, no Conservatório Artes e Comunicação de Oliveira do Bairro, na Associação Jovens Cristãos de Luso, no Club de Ancas e no Colégio Nossa Senhora da Assunção, em Anadia. É o teclista do grupo Lead Voices, da Banda Tempo e do artista Saúl Ricardo.