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Diária

TU CÁ, TU LÁ: “Na Mealhada há qualidade de vida”


quarta, 12 junho 2019

Chama-se Ihor Maslennykov mas, para facilitar a vida dos portugueses, apresenta-se simplesmente como Igor. Nasceu em 1964, na ex-URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas), e vive no concelho da Mealhada há 18 anos. A adaptação a Portugal não foi fácil mas hoje Igor sente-se em casa.

Antes de Portugal e além da ex-URSS, Igor viveu também na Mongólia e na Ucrânia, onde casou, em 1986, com a mãe da sua filha. Domina várias línguas, tem o curso profissional de técnico de cinema, uma licenciatura em engenharia civil e vários cursos profissionais de carpintaria e marcenaria.

Na Ucrânia, já divorciado, entre outras profissões, foi empresário: tinha uma oficina de carpintaria e um café. Foi a falta de dinheiro para investir nos negócios e pagar a casa que o fez vir para Portugal. “Um amigo que já cá estava disse-me, por telefone, que aqui havia muito trabalho e que o salário era bom. Na altura, ele vivia em Lisboa e eu resolvi tentar a minha sorte. Vim para ficar apenas o tempo necessário para juntar o dinheiro que me fazia falta”, recorda Igor, que chegou a Portugal no final de março de 2001.

Na capital, sem saber falar português, com o apoio do amigo ucraniano, Igor começou a procurar trabalho. “Estive duas semanas em Lisboa e nada. Senti-me enganado pelo meu amigo porque não era assim tão fácil arranjar trabalho, como ele me tinha dito. E sem visto de residente, pior ainda”. O desespero terminou quando o amigo de Igor soube de uma oferta de trabalho para os dois em Antes.

Já no concelho da Mealhada, onde encontrou “muitos ucranianos”, esteve cerca de um mês “a cuidar de porcos e galinhas”. À noite, com a ajuda de um dicionário, estudava português. Quando o patrão soube que tinha jeito para carpintaria e marcenaria, ajudou-o a mudar de emprego. Igor agradeceu.

Hoje Ihor Maslennykov é trabalhador por conta própria. Alugou há cerca de dois anos um espaço comercial no centro da Mealhada e é lá que vive e trabalha. A loja está sempre fechada porque Igor sabe que não tem as condições necessárias para manter o espaço aberto ao público. Mas a montra dá a conhecer parte do seu trabalho e também as suas duas gatas que gostam de fazer parte do mostruário, a brincar ou a dormir, suscitando interesse de quem por ali passa.

No estabelecimento, Igor faz peças, úteis ou decorativas, em madeira e bambu, como molduras, prateleiras, máscaras, candeeiros e suportes para velas. “Gostava de fazer mais coisas e até móveis, mas não tenho dinheiro para investir em máquinas e em matéria-prima para trabalhar”, lamenta, acrescentando que as vendas são “fracas”. Ainda assim, “dá para viver”, conclui.

Na Mealhada, Igor sente-se bem, porque conhece “muita gente”, porque é respeitado, porque vive “num sítio sossegado” e porque tem amigos. “Os portugueses já me ajudaram muito”, recorda, fazendo referência a um dos momentos mais difíceis que por cá passou: a amputação de uma perna por doença. A prótese que usa impossibilita-o de andar a pé longas distâncias: “na Mealhada, ando bem porque é tudo perto”.

Se a amizade e a generosidade dos portugueses merecem elogios, o mesmo não se pode dizer da pontualidade: “admirei-me por ter chegado a horas. Quando marcou a entrevista para as 16h, imaginei logo que só ia chegar lá para as 17h”, confidenciou-me, sorridente e sem “papas na língua”.

Igor, que só voltou à Ucrânia uma vez desde que veio para Portugal – “fui ao casamento da minha filha” – tem autorização de residência, mas pretende alcançar a nacionalidade portuguesa. Falta-lhe apenas a certidão do registo de nascimento. Igor quer também continuar a viver na Mealhada e ideias de negócio em várias áreas não lhe faltam. Pô-las em prática tem sido impossível porque escasseiam verbas para investir.