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TU CÁ TU LÁ: Aliona encontrou o “paraíso” em Portugal


tags: Mealhada, Mealhada, Mealhada, Bairrada Categorias: Região quarta, 24 julho 2019

Para Aliona Pislaru, a família está sempre em primeiro lugar. Foi por ela que deixou a Moldávia e se fixou em Portugal, “um país tranquilo, seguro, bonito e desenvolvido”, onde “é possível ter uma vida boa, trabalhando honestamente”. Lá era professora de Matemática e Física; cá, agora, é empregada de limpeza: “no início, custou um pouco – gostava muito de dar aulas – mas já me mentalizei que é para o meu bem e para o bem da minha família, que merece o melhor”.

Aliona nasceu no seio de uma família de classe média alta na zona norte da Moldávia, em Vadul-Rascov, uma aldeia do concelho de Soldanesti. Teve uma infância “muito feliz”, com direito a “tudo e mais alguma coisa”. Era boa aluna e concluiu a licenciatura em Ensino de Matemática e Física com média de 18 valores. Estreou-se a dar aulas numa escola de Soldanesti. Casou com Viorel Pislaru em 1997. Dois anos depois teve o primeiro filho: Cristin. “Foi nesta altura que tudo se complicou. O dinheiro desvalorizou muito, havia pouca comida e era tudo muito caro. Só podíamos comprar o mínimo e indispensável”, recorda Aliona.

Em casa da família Pislaru, havia um telefone – “um dos poucos que existiam na aldeia” – que era usado por uma amiga, para falar com o marido que estava na Mealhada a trabalhar. “Por curiosidade, fomos sabendo coisas de Portugal e acabámos por pedir a esse amigo para nos arranjar emprego. O nosso objetivo inicial era o meu marido vir para cá e ficar apenas durante um ano para juntar algum dinheiro. Queríamos comprar casa lá”, explica. Aliona e Cristin despediram-se de Viorel em 2001. A viagem fez-se de autocarro, juntamente com outros moldavos, com imprevistos pelo meio.

Já na Mealhada, onde partilhou casa com 11 emigrantes, Viorel começou por trabalhar na construção civil. “Só lá ficou três meses porque descobriu que o patrão o estava a enganar – não fazia descontos para a Segurança Social”, conta a esposa. Mudou-se para uma empresa de estruturas metálicas e é lá que trabalha até hoje, assumindo “um cargo importante”. “Este patrão foi espetacular: deu-lhe um salário justo e ajudou-o a legalizar-se”, acrescenta.

Contrariamente ao que estava previsto, em 2001 Aliona junta-se ao marido: “foi muito difícil deixar a família, principalmente o meu filho, que tinha dois anos, e o meu pai, que estava doente. A minha mãe ficou a cuidar dos dois”. À sua espera estavam o marido e uma casa alugada em Antes, “com todas as condições”. Portugal pareceu-lhe “outro mundo” e até um “paraíso”.

“Portuguesa de sangue moldavo”

Aliona chegou a Portugal a 30 de novembro. A 5 de dezembro, começou a trabalhar numa gráfica, na Pedrulha (Casal Comba). Deslocava-se para o novo emprego numa bicicleta emprestada. “Enquadrei-me muito bem no emprego e no país. As pessoas de Antes ajudaram-me muito e os colegas de trabalho também. Sou-lhes muito grata”. A nova língua não foi fácil de aprender, mas também “não foi muito difícil” porque já sabia falar francês. Os primeiros tempos traduziram-se em pouco descanso e muita poupança. “Só tínhamos folga ao domingo”. Trabalho – “ainda hoje” – não se recusava.

Cinco anos depois, o filho juntou-se aos pais e à irmã, Ana Maria, que nasceu em Portugal em 2005. Cristin tem hoje 20 anos e estuda Engenharia Civil na Universidade de Coimbra; Ana Maria, de 13 anos, que se assume “portuguesa de sangue moldavo”, frequenta o 9.º ano na Mealhada. Os filhos falam moldavo com sotaque português, ao contrário dos pais que falam português com sotaque moldavo. “Eu corrijo-os no moldavo, eles corrigem-me no português”, explica a mãe, de 42 anos.

Em Portugal, ao longo dos anos, “aos poucos”, foram muitas as “conquistas”, aos olhos de Aliona Pislaru: “temos uma boa casa e um bom carro”, “tirei a carta de condução”, “já passámos férias noutros países da Europa”, “aprendi a andar de bicicleta”, “somos respeitados e acarinhados”, “temos qualidade de vida”, “os meus patrões confiam em mim e até me recomendam, o que é um orgulho”, “temos muitos amigos portugueses”, “não me falta trabalho”, “já temos nacionalidade portuguesa”, “consigo dar o melhor aos meus filhos”, “tenho ajudado outros emigrantes”. Houvesse espaço e a lista continuaria.

A família Pislaru vive no Reconco, onde se sente “em casa”. A avó, que em tempos cuidou de Cristin, passa temporadas na Mealhada, assim como outros familiares da Moldávia. “Aqui há qualidade de vida”, conclui Aliona, que já não sabe se gosta mais da Moldávia ou de Portugal.